Gervásio Borges foi diagnosticado, em agosto de 2021, com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), doença degenerativa e progressiva que causa paralisia motora irreversível. Em novembro de 2022, o morador de Brasília morreu, com paralisia dos órgãos.
Mas a morte não era um medo para ele – conta a família. Seu maior temor, na verdade, era de não conseguir fazer as coisas que mais gostava.
Motociclista apaixonado por viagens, boas comidas e pelos pequenos prazeres da vida, "Vavá", como os parentes o chamavam, era um aventureiro nato. Por esse motivo, passar o resto de seus dias perdendo, aos poucos, a independência, era doloroso para ele, que repetia para a família sua aversão a viver preso a aparelhos.
No início, foi difícil para Cida, esposa de Vavá, e para João Quinto, filho deles, lidarem com a dor de se sentirem impotentes diante do sofrimento de alguém querido. No entanto, eles encontraram uma forma de trazer o máximo de conforto e prazer para o dia a dia de Gervásio até a hora da partida.
Por meio de cuidados paliativos, ele aproveitou seus últimos momentos com a família e até planejou o dia de seu velório, ou "cerimônia de despedida", como preferia chamar.
Cuidado à terminalidade
Cuidados paliativos consistem na atenção multiprofissional dedicada a pacientes portadores de doenças que ameaçam a continuidade da vida, com o objetivo de controlar os sintomas e melhorar a qualidade de vida. Envolvem, também, cuidados aos familiares dos pacientes, que recebem suporte no luto.
"Um dos pilares do cuidado paliativo é ser um cuidado centrado na pessoa, sendo esta reconhecida e valorizada como um ser biográfico, muito mais amplo do que um ser biológico, nomeado por seu diagnóstico", diz a médica Thaís Boaventura.
Thaís é geriatra com área de atuação em medicina paliativa do Hospital Brasília. Foi ela quem chefiou os cuidados de Gervásio na unidade de Águas Claras, no Distrito Federal.
Ela conta que ele, ao receber o diagnóstico, já elaborou suas "diretivas antecipadas de vontade". Por meio dessas diretivas, o paciente nomeia um procurador para fazer valer seus desejos sobre os próprios cuidados médicos no fim da vida.
“Nas diretivas do 'seu' Gervásio, conhecendo o caráter irreversível da sua doença, ele já tinha feito um manifesto a favor de seguir a trajetória da maneira mais confortável possível. A história natural da sua doença, sem considerar aceitável receber medidas que pudessem prolongar sua vida a todo custo e, de repente, causar ainda mais sofrimento", conta a médica.
A médica explica que é importante a medicina reconhecer que os pacientes com doenças ameaçadoras à vida merecem muito cuidado e que, dentro desse cuidado, "eles também merecem o reconhecimento da sua terminalidade".
Segundo a geriatra, é preciso respeitar a chegada do momento da morte e garantir que o paciente não deixe de receber nada que seja importante para a manutenção da sua vida até o momento certo.