Para Yanina, viver em um país com alta inflação não é novidade: quando ela abriu um minimercado há dez anos em um bairro popular da Grande Buenos Aires, a inflação anual ultrapassava 25%.
Apesar de a taxa ter crescido ao longo dos anos até dobrar, as pessoas “manejavam” e ainda conseguiam se virar, diz ela.
No entanto, desde que o aumento dos preços acelerou, passando de cerca de 50% para 95% ao ano em 2022 e indo para 108,8% ao ano em abril de 2023, os hábitos de seus clientes mudaram.
Antes, de cada dez itens que eles compravam, cerca de quatro eram de necessidades básicas, diz ela. Hoje, milhões de argentinos não conseguem sequer satisfazer suas necessidades básicas. Segundo dados divulgados no fim de março pelo Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec), 4 em cada 10 argentinos são considerados pobres.
E a situação é ainda mais dramática entre as crianças: mais da metade dos menores de 14 anos (54,2%) vive abaixo da linha da pobreza — quase 6 milhões de crianças.
Economistas projetam que a taxa continuará aumentando este ano, como resultado do novo impulso que a inflação tomou em março e abril, quando atingiu 7,7% e 8,4% ao mês, respectivamente, ponto mais alto desde a crise econômica de 2002, o pior ano da história do país.
A Argentina superou a Venezuela pela primeira vez em décadas na inflação mensal, embora a cifra ano a ano da Venezuela ainda seja quase cinco vezes maior que a da Argentina.
A inflação afeta desproporcionalmente quem tem menor renda, já que os preços que mais sobem são os dos alimentos, que constituem a maior despesa das famílias trabalhadoras.
Além disso, os setores de renda mais baixa ficam desprotegidos contra o aumento dos preços porque tendem a ter empregos informais, que não são cobertos por uma ferramenta que vem sendo utilizada nos últimos vinte anos para proteger a população contra a inflação: a paridade (acordos entre sindicatos, empresas e governo para ajustar salários à alta de preços).